Quatro em cada cinco crianças da rede municipal de ensino estão com sobrepeso ou obesas, aponta pesquisa

Pesquisa realizada no ano de 2019, antes do início da pandemia da Covid-19, revelou que 80% dos estudantes estavam com sobrepeso ou obesos. Desde 2020, a alimentação ofertada para as crianças de até três anos tem isenção total da oferta de açúcar, incluindo açúcar mascavo, demerara, mel, melado e geleias. Para as demais, alimentos com açúcar são ofertadas no máximo duas vezes ao mês. Medida faz parte da resolução do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação/FNDE n° 06/2020, do Ministério da Educação

Quatro em cada cinco crianças da rede municipal de ensino estão com sobrepeso ou obesas, aponta pesquisa
Frutas e verduras serão oferecidas todos os dias para as crianças das escolas de Educação Infantil e duas vezes por semana para os alunos do Ensino Fundamental

O Município de Três de Maio atende a 2.300 crianças da rede municipal de ensino, divididas em oito escolas de Educação Infantil, seis Escolas de Ensino Fundamental, sendo quatro escolas do campo e duas em turno integral, e duas escolas de extensão, destinadas a alunos da pré-escola. Atualmente são servidas mais de 65 mil refeições ao mês, distribuídas entre café da manhã, almoço e dois lanches (para crianças de zero a três anos) e, e um lanche por turno aos demais alunos.

Conforme dados do Setor de Alimentação Escolar da Secretaria Municipal de Educação, Cultura e Esporte (SMECE), todo o cardápio oferecido na rede municipal segue normativas da Lei n° 11.947/2009, e a Resolução n° 06/2020. Entre algumas normas da Resolução está a isenção total da oferta de açúcar. A isenção é estendida ao leite, chá e sucos. A norma vem auxiliar para que crianças e adolescentes tenham uma vida mais saudável e na prevenção de doenças na vida adulta. 

Conforme a nutricionista Daniela da Rosa, responsável pelo setor na rede municipal, uma pesquisa realizada em 2019, ou seja, antes do início da pandemia da Covid-19, com os estudantes da rede municipal - desde creches ao ensino fundamental - revelou que quatro em cada cinco crianças estão com sobrepeso ou obesos, ou seja, 80% dos estudantes não estão dentro do peso ideal. A pesquisa mostrou também que são poucos os casos de desnutrição ou baixo peso.

A nutricionista, em entrevista ao Jornal Semanal, relata as atividades desenvolvidas, os desafios encontrados e os caminhos que o Município está promovendo para melhorar a alimentação escolar dos estudantes da rede municipal de ensino.

A nutricionista considera o momento de atenção das famílias, pois há o cuidado com a saúde dos estudantes e na prevenção de doenças. “O trabalho aqui realizado é de prevenção e formação de hábitos alimentares mais saudáveis, para que, no futuro, quando adultos tenham consciência alimentar”, avalia.

Dessa forma, Daniela ressalta a importância da escola para formar hábitos alimentares saudáveis e, pede a participação e colaboração da família, para que juntos - família e escola -, possam fazer um futuro mais saudável, e, consequentemente menos doente.

 

Orçamento do setor

O setor de alimentação escolar da Secretaria Municipal de Educação é responsável pelos pedidos das licitações (descrição e quantidade dos alimentos e verbas orçamentárias), chamadas públicas (quando envolvem a agricultura familiar), controle do orçamento anual, elaboração dos cardápios escolares, educação nutricional dos alunos, formações de boas práticas de fabricação com as cozinheiras e avaliação nutricional com encaminhamento das crianças que estão sob risco de desnutrição ou sobrepeso

De acordo com Daniela, os cardápios escolares são elaborados de acordo com os recursos destinados para a finalidade. “Para este ano, teremos um custo de mais de R$ 1,5 milhão em merenda escolar”, revela. Desse valor, o repasse anual do Governo Federal chega a R$ 300 mil e o restante - R$ 1,2 milhão - é de contrapartida do Município. “Esse valor deve garantir uma alimentação saudável, variada e nutritiva a todos os educandos”, relata.

Os recursos do Governo Federal são provenientes da adesão ao Programa Nacional de Alimentação Escolar/PNAE. Esses valores são repassados de acordo com o número de alunos (per capita). 

Conforme a nutricionista, os alunos da Educação Infantil, que fazem quatro refeições/dia, o valor do repasse é R$ 1,00 por aluno. Já os alunos atendidos no Ensino Fundamental, que recebem um lanche/dia, o repasse é R$ 0,50 por aluno.

Para a compra dos alimentos são realizadas duas modalidades de licitações. Pregão presencial, no início do ano, e chamada pública, direcionada à compra de produtos da agricultura familiar.

 

86% dos alimentos vêm da agricultura familiar, meta é chegar a 100%

Por exigência de lei, cada município deve adquirir, no mínimo, 30% do valor do repasse com compras de gêneros alimentícios de agricultores e/ou cooperativas de agricultores. “Em 2021, 86% da merenda oferecida aos nossos alunos veio da agricultura familiar ou cooperativas. para este ano queremos atingir 100%”, revela a nutricionista.

 

Elaboração dos cardápios

Daniela ressalta que todo o cardápio oferecido na rede municipal segue normativas da Lei n° 11.947/2009 e da Resolução n° 06/2020. Segundo o PNAE, essas orientações tem por objetivo “contribuir para o crescimento e o desenvolvimento biopsicossocial, a aprendizagem, o rendimento escolar e a formação de práticas alimentares saudáveis dos alunos, por meio de ações de educação alimentar e nutricional e da oferta de refeições que cubram as suas necessidades nutricionais durante o período letivo”. “O cardápio é composto por frutas, verduras, refeições salgadas, como arroz, feijão, carnes, entre outros, além de  sucos naturais, salgados assados e bolacha caseira”.
Para as crianças que são portadoras de alergias e intolerâncias alimentares, além das crianças que possuem patologias como diabetes mellitus, hipertensão arterial ou dislipidemias, que sempre devem apresentar atestado médico para comprovação, são elaborados cardápios diferenciados.
Isenção do açúcar
Daniella explica que conforme a nova resolução do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação/FNDE no 06/2020, o programa de alimentação escolar está seguindo os Guias de Alimentação Saudável para crianças e adultos preconizados pelo Ministério da Saúde.
A nutricionista lista algumas mudanças no cenário escolar, como a isenção total da oferta de açúcar, incluindo açúcar mascavo, açúcar demerara, mel, melado e geleias. A isenção inclui ainda o leite, chá e sucos para todas as crianças até três anos de idade.
Há a oferta de frutas três vezes ao dia, entre café da manhã e lanches. Frutas e/ou verduras serão oferecidas todos os dias nas escolas de Educação Infantil e duas vezes por semana nas escolas de Ensino Fundamental. Os alunos da Educação Infantil I, II e III (até três anos de idade) recebem a pré-janta. Daniela relata que haverá o dia do ovo, sendo “uma vez por semana em substituição ao pão. Ao mesmo tempo, o cardápio terá uma apresentação para preparações mais salgadas, devido aceitação das crianças ser maior”.

 

Receptividade das crianças às mudanças de cardápio

As alterações nos processos do cardápio começaram no ano passado, de forma gradativa. “Aos poucos, os bolos e bebidas eram oferecidas com menos açúcar. Neste ano, já começamos sem nada de açúcar, inclusive nem foi comprado na licitação”, revela.

No começo, a aceitação foi pequena, com rejeição significativa dos estudantes. “O paladar das crianças que chegam às escolas ainda é muito doce. Desde bebês eles já são acostumados a ganhar bebidas com açúcar, como por exemplo, o leite com achocolatados. Agora, nas escolas não tem mais isso, então, estávamos preparados para a rejeição”, justifica.

No último mês, as escolas estão notando uma melhora na aceitação dos cardápios e o aumento do consumo da alimentação escolar. “O processo é lento, mas possível de realizar”, conclui.

 

Mudanças do cardápio e atividades de educação nutricional

Entre as alterações que foram necessárias para a atual realidade de isenção de açúcar, Daniela destaca que, na elaboração de bolos por exemplo, foram adaptadas as receitas para serem adoçadas com a própria fruta ou com a uva passa. “Os cardápios também estão com preparações mais salgadas, pois a aceitação das crianças é bem melhor”, diz.

A mudança no cardápio alimentar é trabalhado com as famílias, desde o ano passado, através de informativos e trabalhos pedagógicos com as crianças frequentemente.

O setor de alimentação escolar também promove palestras sobre alimentação saudável, avaliação nutricional com os alunos, além de oficinas culinárias junto às escolas. “As cozinheiras das escolas também passam por formações e desenvolvem receitas saudáveis para compor o cardápio escolar, que em seguida, são compiladas em um livro de receitas”, conta.

‘Os pais podem ajudar no combate à obesidade, com ações simples, como por exemplo, enviar lanches saudáveis para as crianças do ensino fundamental, e em casa, oferecer mais frutas e lanches caseiros, limitando o consumo de refrigerantes somente para o final de semana. São pequenas atitudes, mas que geram excelentes resultados’, orienta a nutricionista da rede municipal de ensino de Três de Maio, Daniela da Rosa

 

Hábitos alimentares inadequados

A nutricionista revela que as crianças possuem o hábito de consumir produtos industrializados. “Muitas vezes, eles não têm fome de comida e sim, de biscoitos recheados e salgadinhos, por exemplo”, destaca.

Contudo, ela afirma que, antes mesmo da resolução, já havia o trabalho com as famílias para que enviassem lanches saudáveis para seus filhos. “Não é permitido a entrada de refrigerantes, salgadinhos, doces e outros industrializados. Sabemos que ainda muitas famílias não tiveram um entendimento positivo quanto a essa restrição, pois ainda insistem em enviar lanches ‘inadequados’ para seus filhos, como por exemplo, tirando os salgadinhos das próprias embalagens e colocando em outros potes para disfarçar e se passar por saudável”, lamenta a profissional.

 

Em 2019, 80% das crianças da rede municipal estavam  acima do peso  

Conforme a nutricionista, a avaliação nutricional realizada com os alunos da rede municipal de ensino de Três de Maio, que ocorreu anteriormente à pandemia da Covid-19, apontou que a cada cinco crianças, quatro estavam em sobrepeso, ou seja, 80% das crianças. Porém, em relação à desnutrição ou baixo peso, as escolas apresentaram poucos casos.

A nutricionista destaca que o assunto é trabalhado diariamente. “Os cardápios saudáveis, informativos às famílias, palestras educacionais, restrições na entrada de alimentos industrializados nas escolas e a cantina saudável, são ações para conscientização das famílias, alunos, professores e funcionários das escolas da rede municipal. O trabalho deve ser contínuo e com apoio da família, pois só juntos, teremos uma mudança nesse quadro de obesidade infantil”, reforça Daniela.

Com a pademia, que limitou as crianças a espaços ao ar livre e acesso à alimentação balanceada ofererecida nas escolas, a  nutricionista acredita que o percentual de crianças acima do peso possa ter aumentado, porque praticamente um ano as crianças ficaram em casa.

 

Problemas que o sobrepeso infantil pode causar

Atualmente, a obesidade é caracterizada como uma doença de origem multifatorial. A nutricionista explica que o excesso de peso nas crianças pode resultar em doenças que antes eram caracterizadas somente em adultos, por exemplo, diabetes mellitus, hipertensão arterial, dislipidemias (colesterol, triglicerídeos altos), câncer, disbiose intestinal (alteração da microbiota do intestino), distúrbios consideráveis no crescimento e também na aprendizagem do aluno, e até mesmo distúrbios no sono.

 

Pais podem auxiliar no combate do sobrepeso e obesidade infantil

Para Daniela, os pais podem ajudar na resolução do problema com ações simples, como por exemplo, enviar lanches saudáveis para as crianças que frequentam as escolas de Ensino Fundamental, respeitando os novos critérios e ações de educação nutricional que estão sendo realizados. 

“Melhorando a alimentação em casa, disponibilizando mais frutas e lanches caseiros para as crianças. Limitando o consumo de refrigerantes somente para o final de semana. Enfim, pequenas atitudes, mas que geram excelentes resultados”, alerta.