'Ela nos amou por 30 anos e foi amada por 30 anos'

Francine Borges, faleceu aos 30 anos, em decorrência de um aneurisma cerebral e teve seus órgãos doados, reforçando o espírito generoso que sempre marcou sua trajetória

'Ela nos amou por 30 anos e foi amada por 30 anos'

"Menina linda e incrível que, desde criança, estava envolvida nas atividades esportivas. Acompanhava o pai nos jogos de futebol e futsal e a irmã Fernanda nos jogos de vôlei. Teve uma infância RAIZ, moleca, sempre cercada de muita gente. Foi bondosa, cuidadosa, gentil e iluminada. Tinha um coração muito generoso. Amava e cuidava de seus amigos, familiares e afilhados, sempre dizendo o quanto os amava cada ao se despedir.

Com ela, não tinha tempo ruim.Filha carinhosa, irmã amorosa, dinda cuidadosa,  incrível,  brilhante e iluminada. Sua energia positiva era contagiante. Tinha a capacidade de transformar os ambientes e os relacionamentos, era um ser humano de luz", assim Francielle Borges Rambo e Fernanda Borges Heimerdinger descrevem a irmã mais nova, Francine Borges - a Fran Baby -, que faleceu no dia 29 de janeiro, aos 30 anos, em consequência de um aneurisma cerebral. Ela é filha de Claudete (Dindé) e Valdecir (Gringo) e dinda da Malu, Joana, Rafael e Luísa e cunhada do Rudá e do Adriano.

Como profissão, escolheu a arte de registrar os  momentos importantes da vida das pessoas por meio da fotografia. Era fotógrafa no Studio Criativo, que  considerava sua segunda família. Sua morte precoce e inesperada comoveu seu grande número de amigos e a comunidade três-maiense. 

 

Dores de cabeça constantes

Conforme Francielle, a irmã sempre teve dores de cabeça, assim como  muitas pessoas.
"Ela associava a dor ao período fértil, ao estresse, à rotina. Há alguns meses,  procurou tratamento médico com neurologista. Foi feita a troca do anticoncepcional, e ela apresentou melhora. A médica sugeriu uma ressonância, mas ela acabou protelando com a melhora, após a troca do contraceptivo.

A Fran também estava mais magra desde outubro. A falta de apetite e emagrecimento foram associados à rotina intensa de trabalho com a chegada do fim de ano. Hoje sabemos que esse também é um sintoma",  revela a irmã. 

No dia 13 de janeiro, quando tudo começou,  Francine teve uma dor de cabeça  repentina e insuportável.. Buscou imediatamente atendimento  na emergência do Hospital Vicente de Paulo, onde logo foi encaminhada para  exames. 

"Após o resultado da tomografia, veio o diagnóstico de que se tratava de um aneurisma cerebral, e era uma situação muito grave. Ela foi transferida para a UTI do Hospital Vida e Saúde de Santa Rosa, onde ficou sob os cuidados de uma equipe espetacular. O procedimento foi realizado no Hospital da Unimed, em Santo Ângelo, por uma equipe de Passo Fundo, com um neurologista especialista em aneurisma cerebral", conta Francielle. 

O procedimento realizado foi a embolização do aneurisma cerebral,  considerada uma opção menos invasiva. Porém, durante o procedimento, segundo relato dos médicos, Francine teve uma convulsão e houve a ruptura do aneurisma, causando  um AVC hemorrágico. 

"Foram 18 dias de angústia, medo, incerteza, mas também de muita fé. Agradecemos a todas as pessoas que rezaram pela recuperação da saúde da nossa Fran.

Mas,  infelizmente, o quadro clínico não melhorava, e veio então a notícia da morte cerebral".

Segundo a família, os médicos acreditam que o aneurisma da Francine seja do tipo hereditário, já que há 14 anos, uma tia também teve o mesmo problema. "Os médicos  acham que ela já nasceu com uma má formação no cérebro", explica Francielle.

 

Francine (última a direita da foto) adorava estar em família. Registro é com os pais, irmãs, cunhados e sobrinhos em um dos muitos momentos vividos em família

 

A decisão pela doação de órgãos

As irmãs contam que, ao ser confirmada a morte cerebral, a família - pais, irmãs e cunhados - se reuniu com  a equipe médica da UTI, que explicou sobre as possibilidades em casos de morte encefálica. 

"Em nenhum momento,  enquanto família, pensamos em outra possibilidade, senão a doação de órgãos. Oficialmente, nunca havíamos conversado sobre isso, mas sempre falávamos de maneira informal na família. 'Ah, que legal doar, né?', ou "Quando eu morrer, podem doar meus órgãos'. Nada oficial, sempre assim, de maneira casual. Quando a médica nos disse que teríamos um tempo para pensar, nos olhamos e a unanimidade pairou sobre aquela sala. Com certeza, era isso que ela faria também. Um ser tão bondoso não pensaria diferente. E ela foi uma menina DIFERENCIADA. É como se estivesse lá conosco, soprando no nosso ouvido: 'Façam isso!'"

Segundo a família, mesmo que Francine tivesse escrito no documento de identidade ou em qualquer outro documento,  a palavra final caberia a família. 

"O que podemos dizer para as pessoas que são doadoras de órgãos é: conversem sobre esse assunto com seus familiares", orientam as  irmãs.

 

Amava a vida e amava estar em família 

Conforme as irmãs, Francine acreditava em um mundo melhor, baseado na paciência, amor e união. Gostava de estar com as pessoas que a amavam e que ela também amava. Gostava da simplicidade e não tinha pressa. 

"Sentar embaixo da mangueira, tomar um tererê ou um chimarrão com a família. Fazer um dormidão com os afilhados. Assistir séries de TV, Harry Potter e ir ao cinema. Ler seus livros de romance e estar em família. É isso que mais nos conforta, pois vivemos muitos momentos intensos com ela."

 

Campanha mobilizou a comunidade

Ao receber o diagnóstico de Francine,  o médico explicou  sobre os dois tipos de procedimentos possíveis  para o aneurisma cerebral. 

"Ela optou  pela embolização cerebral por ser minimamente invasiva e muito eficaz. Porém, para realizar o procedimento,  precisávamos de um valor muito elevado para realizar. Foi aí que surgiu a ideia da Vaquinha Solidária dos amigos da Fran, e assim fizemos."

A divulgação aconteceu pelas redes sociais e grupos do Whatsapp, mobilizando familiares e amigos. A campanha tomou proporções inesperadas.  

"Foi algo incrível, que nos emociona muito. Em seis horas, já tínhamos conseguido o valor necessário. Foram mais de 1.400 contribuições, mas sabemos que tem muito mais pessoas ajudaram, pois vários se reuniram para doar um valor em um único pagamento. Gostaríamos de expressar nossa profunda GRATIDÃO a todos que contribuíram para que a cirurgia da Fran pudesse acontecer. Graças à generosidade das pessoas, conseguimos arrecadar os recursos necessários. Cada doação e cada gesto de carinho fizeram toda diferença e serão eternamente lembrados com muito agradecimento. Contamos para ela, e lembro como se fosse hoje a expressão de gratidão e luz que ela manifestou. Ela ficou muito emocionada. 

Essa menina era incrível. Quem conheceu, sabe. Quem não conheceu, descobriu.

Tantas pessoas ajudaram, tantos corações pulsaram junto aos nossos. Como não acreditar em um mundo melhor?  A Fran nos amou por 30 anos. Ela foi amada por 30 anos.  É sobre isso", finalizam as irmãs Fernanda e Francielle.

 

 

 

ANEURISMA CEREBRAL: o que é, sintomas, fatores de risco e quando procurar ajuda médica?

O aneurisma cerebral é uma condição que pode parecer assustadora, mas entender melhor o que é, como se desenvolve e quais são os sinais de alerta pode fazer toda a diferença. Para falar sobre o assunto, o Semanal entrevistou o médico neurologista de Três de Maio, Dr. Valdemar F. Borges Neto, que esclareceu os principais pontos sobre esse problema, ajudando a reconhecer sintomas precoces e a tomar decisões baseadas em informação.

 

 

O que é um aneurismacerebral? 

O aneurisma cerebral é uma dilatação anormal em uma artéria do cérebro, semelhante a um balão que se forma em um ponto de fragilidade da parede do vaso sanguíneo. Com o tempo, essa dilatação pode aumentar e, em alguns casos, romper-se, causando um sangramento cerebral conhecido como hemorragia subaracnóidea. Nem todos os aneurismas se rompem, mas, quando isso acontece, pode ser uma condição grave e potencialmente fatal.

Existem múltiplas maneiras de classificar os aneurismas: 

- Quanto à forma : Sacular - forma de balão ou arredondada. Fusiforme - alargamento difuso e irregular. Dissecante - surge por lesão nas paredes do vaso sanguíneo. 

- Quanto ao tamanho: Pequeno - menor que 5mm.  Médio:  entre 5 e 10mm. Grande: até 25mm. Gigante: maior que 25mm. 

- Quanto à localização: Isto é, qual a artéria afetada.

Muitos aneurismas são pequenos e assintomáticos, sendo descobertos acidentalmente durante exames de imagem feitos por diversos outros motivos. No entanto, aneurismas maiores ou com risco aumentado de ruptura podem causar sintomas e exigir intervenção médica.

 

Como o aneurisma cerebral evolui?

A evolução do aneurisma é muito variável. Alguns permanecem estáveis e nunca se rompem, enquanto outros crescem progressivamente e se tornam mais frágeis e de maior risco. A taxa de crescimento pode ser influenciada por diversos fatores, como pressão arterial elevada, tabagismo e predisposição genética.

Se um aneurisma crescer e pressionar estruturas cerebrais, pode causar sintomas antes mesmo de se romper. Quando há ruptura, o quadro se torna uma emergência médica e exige atendimento imediato para reduzir as chances de sequelas graves ou morte.

 

Fatores de risco: quem tem maior chance de desenvolver um aneurisma?

Vários fatores aumentam o risco de desenvolver um aneurisma cerebral ao longo da vida, incluindo:

1. Hipertensão arterial: A pressão alta constante pode enfraquecer as paredes dos vasos sanguíneos.

2. Tabagismo: Substâncias tóxicas do cigarro prejudicam a integridade das artérias e aumentam o risco de ruptura.

3. Histórico familiar: Pessoas com parentes de primeiro grau que tiveram aneurismas apresentam risco maior.

4. Uso excessivo de álcool e de outras drogas: O consumo de grandes quantidades de álcool e o uso de drogas ilícitas, como cocaína, podem danificar os vasos sanguíneos.

5. Idade e sexo: Aneurismas são mais comuns em pessoas acima dos 40 anos e têm uma incidência maior em mulheres.

6. Doenças do tecido conjuntivo: Algumas condições genéticas, como a Síndrome de Ehlers-Danlos e a Doença Renal Policística, estão associadas a aneurismas.

Embora esses fatores aumentem o risco, muitas pessoas desenvolvem aneurismas sem ter nenhuma dessas condições, o que torna o acompanhamento médico e a atenção aos sinais de alerta ainda mais importantes.

 

O aneurisma cerebral é hereditário?

A hereditariedade pode desempenhar um papel importante. Estudos mostram que pessoas com um histórico familiar de aneurismas (especialmente em parentes de primeiro grau, como pais e irmãos) têm um risco maior de desenvolver a condição. Por isso, médicos podem recomendar exames preventivos para familiares de pessoas que tiveram aneurismas, especialmente se ocorrerem múltiplos casos na família.

 

Pródromos e sinais de alerta: como reconhecer a possibilidade de um aneurisma? 

Na maior parte das vezes o aneurisma é silencioso, sem quaisquer sintomas. Somente quando está prestes a se romper é que demonstra sintomas ou sinais de alerta. Estes podem incluir:

• Dor de cabeça persistente, de origem recente e diferente das dores habituais que o indivíduo sente;

• Visão turva ou dupla, ou mesmo intensa intolerância à luz;

• Dor atrás ou ao redor dos olhos;

• Fraqueza ou dormência em um lado do rosto ou em outras partes do corpo;

• Dificuldade para falar ou confusão.

Esses sintomas podem ser sutis e progredir com o tempo. Note que são muito inespecíficos e podem ser facilmente confundidos com outros problemas neurológicos como enxaquecas comuns, etc. Por isso, qualquer sintoma fora do padrão, recente, muito intenso e persistente deve ser obrigatoriamente investigado.

 

Quando desconfiar de um aneurisma rompido?

A ruptura de um aneurisma causa um quadro grave e repentino. Os principais sintomas incluem os descritos acima e ainda:

• Dor de cabeça intensa e súbita: Muitas vezes descrita como “a pior dor de cabeça da vida do paciente”.

• Náusea e vômito: Ocorrem devido ao aumento da pressão no cérebro.

• Rigidez no pescoço: Dificuldade de movimentar a cabeça pode indicar irritação das meninges pelo sangue.

• Desmaios ou perda de consciência: Indica um sangramento grave.

• Convulsões: Algumas pessoas podem ter crises epilépticas.

• Alterações na fala ou na visão: Se a hemorragia afetar áreas específicas do cérebro.

Se alguém apresentar esses sintomas, precisa receber atendimento emergencial, o mais imediatamente possível. O tempo é crucial para aumentar as chances de sobrevivência e reduzir sequelas.

 

Como proceder em caso de suspeita?

Se houver suspeita de aneurisma ou um histórico familiar forte, o primeiro passo é procurar um médico neurologista ou neurocirurgião. Após proceder o exame físico e neurológico serão solicitados exames de imagem, tais como angiotomografia, angioressonância ou angiografia cerebral. Estes são necessários para confirmar o diagnóstico e orientar a abordagem.

Caso um aneurisma seja identificado, o tratamento dependerá do tamanho, da localização e do risco de ruptura. Em alguns casos, apenas o acompanhamento regular é suficiente. Quando há risco elevado, pode-se optar por:

1. Clipagem cirúrgica: Fechamento do aneurisma com um clipe metálico para evitar a ruptura.

2. Embolização endovascular: Inserção de espirais ou stents através de um cateter para reforçar o vaso sanguíneo ou bloquear a circulação no aneurisma.

Cada caso é avaliado individualmente para definir a melhor abordagem.

 

Quais são as chances de um aneurisma sangrar ao longo da vida? 

A probabilidade de um aneurisma se romper depende de diversos fatores, incluindo o tamanho, a localização e os hábitos de vida da pessoa. Em geral:

• Aneurismas menores que 5 mm têm um risco muito baixo de ruptura.

• Aneurismas entre 5 e 7 mm apresentam risco moderado.

• Aneurismas maiores que 10 mm têm um risco significativamente maior.

Estudos indicam que o risco médio de ruptura de um aneurisma não tratado varia entre 0,5% e 1% ao ano, mas pode ser maior dependendo do perfil do paciente. Pessoas que fumam, têm pressão alta descontrolada ou histórico familiar estão no grupo de maior risco.

 

A importância da prevenção

O aneurisma cerebral é uma condição séria, mas nem sempre significa um problema imediato. A melhor forma de prevenção é controlar os fatores de risco, realizar exames periódicos se houver histórico familiar e ficar atento aos sinais de alerta. 

Em caso de suspeita, a avaliação médica é essencial para definir a melhor estratégia de acompanhamento ou tratamento.