A descoberta do câncer, a mudança de planos, a luta e a resiliência de Maidi Dalri
Em um exame de rotina e de malas quase prontas para mais uma missão na África, a empreendedora e empresária três-maiense Maidi Dalri, 50 anos, se deparou com uma situação inesperada, que interrompeu seus projetos e mudou o rumo da sua vida temporariamente.
Após ter passado 13 meses trabalhando num projeto lindo junto à Unicef (Fundo das Nações Unidas para a Infância) da ONU (Organização das Nações Unidas), no país de São Tomé e Príncipe, ela recebeu o convite para continuar no programa por mais um ano. No país africano, ela vivenciou realidades totalmente diferentes, especialmente no que diz respeito à saúde, em que os recursos disponíveis são muito precários.
Maidi retornou ao Brasil no dia 17 de dezembro, para efetuar os preparativos e partir com a família para mais uma estadia na África. Contudo, os planos foram temporariamente suspensos no dia 29 de dezembro, ao realizar exames de rotina – em Três de Maio quando estava em visita a familiares e amigos – e descobrir o câncer de mama. No momento em que recebeu o diagnóstico, ela confessa que a “ficha não caiu”. “O médico que estava fazendo o meu exame (ultrassonografia da mama) afirmou com convicção já se tratar de câncer maligno, mesmo sem a biópsia. Após esse pré-diagnóstico encaminhei todos os exames e, infelizmente, veio a confirmação”, lembra.
Com a cabeça atordoada, após o diagnóstico, Maidi não tinha ideia como iria começar o tratamento. "Pior que isso, tendo passado 13 meses na África eu estava com o meu seguro saúde vencido já 10 dias antes do diagnóstico e sem plano de saúde”, recorda Maidi, que mora há sete anos em Palhoça, Santa Catarina.
Ela retornou para casa e na sua cidade iniciou o processo para buscar o tratamento. “Iniciamos os contatos com a nossa rede e em pouco tempo estávamos conectados com o Cepon (Centro de Pesquisas Oncológicas de Florianópolis) e ali encontrei tudo o que precisava tanto para o tratamento quanto para o acolhimento”.
Também nesse período, Maidi iniciava uma jornada de aprendizagem não apenas sobre o câncer de mama mas sobre diversos assuntos que envolvem saúde, vida e relações. “Hoje é possível identificar três tipos de câncer de mama e o meu era do tipo XYZ – ele não respondia bem à quimioterapia antes da cirurgia, ou seja, não adiantaria fazer quimioterapia para diminuir o tumor que isso não iria acontecer. Por isso o meu tratamento foi iniciado com a cirurgia, depois a quimioterapia e na sequência radioterapia e imunoterapia”, conta.
Neste relato, conheça a história de luta, fé e resiliência de Maidi Dalri, casada com Carlos Ceccon há 29 anos, mãe do Carlos Eduardo, 26 anos, e do Gabriel, 15. Atualmente empreendedora e empresária na TopSer Consultoria e Desenvolvimento, ela atua como consultora em Inovação e Educação, Especialista em Metodologias Ativas e Curadora em Tecnologias Digitais
O primeiro impacto ao descobrir o câncer de mama
"No momento em que me deram o primeiro diagnóstico a ficha não caiu, pois o médico que estava fazendo o meu exame (ultrassonografia da mama) afirmou com convicção já se tratar de câncer maligno, mesmo sem a biópsia. Após esse pré-diagnóstico encaminhei todos os exames e, infelizmente, veio a confirmação.
Eu acredito que a grande maioria das pessoas, independentemente da idade ou sexo tem a mesma reação ao descobrir um câncer maligno que é: eu vou morrer.
Sinceramente acho muito difícil alguém que passou por essa experiência e não teve esse sentimento. O que vem posterior a isso, acredito que difere das histórias de vida, da idade, das experiências, da fé e da força de vontade de cada um.
Não é um período fácil de forma alguma. Nos primeiros dias você fica em choque pois começa a pensar e repensar a sua vida, as suas relações, o que tem para fazer, o que não vai conseguir fazer se morrer, e principalmente, o sentido da vida.
Em momento algum, no entanto me questionei o porquê eu ou o porquê dessa forma, mas sim estava muito triste e tentando entender como passar por tudo isso e como começar o meu tratamento.
Foram vários momentos difíceis, dentre eles: primeiramente se dar conta que era real e não talvez um diagnóstico errado, compartilhar o diagnóstico com os filhos, comunicar minha equipe de trabalho da TopSer e a todas as equipes da África sobre esse momento, se dar conta da brevidade da vida e encontrar forças para encarar os desafios que viriam pela frente. A palavra para esse período foi resiliência."
Nova rotina após o diagnóstico
"Bah, mudou muito. Tanto na vida profissional quanto na vida pessoal. No início eu até tinha a ilusão de que conseguiria levar alguns projetos de trabalho de forma mais efetiva e me envolver com novos aprendizados.
Contudo, as quimioterapias realmente alteram a vida da maioria das pessoas. Eu tive diversos efeitos colaterais e eles às vezes se organizavam para aparecer (às vezes, vinha um de cada vez) e outras vezes apareciam todos juntos.
Contudo, para mim, o pior não foram os momentos de tontura, fraqueza ou ânsias e sim os efeitos colaterais sofridos pelo cérebro. Embora pouco se fale disso, o efeito da quimioterapia sobre o cérebro é chamado de névoa cerebral ou em inglês ‘chemobrain’. E esse efeito foi constante e ainda poderá estar comigo por um bom tempo. Ele faz com que o pensamento se torne bem mais lento, até mesmo a fala fica mais lenta e a memória também fica extremamente comprometida. Para mim foi complicado, pois isso não me permitiu seguir com estudos, leituras, ou apoio a projetos e educadores na área de educação ao longo deste ano.
Talvez para algumas pessoas que passam pelas quimioterapias isso não seja algo importante, mas no meu caso, depois da minha família a coisa mais importante é estar aprendendo, seja aprendizados pessoais ou profissionais, por isso me impactou tanto.
Outra coisa que modificou muito foi a mobilidade com os braços, devido a retirada dos linfonodos, que são as glândulas que protegem o nosso corpo e nos ajudam a desenvolver a imunidade. Por estarem muito próximas de todo o sistema nervoso, na maioria das cirurgias que envolve a retirada dos linfonodos a proteção e a fora do braço fica comprometida. No meu humilde ponto de vista esses efeitos colaterais são bem mais complicados que a queda do cabelo e mesmo a reconstrução da mama, pois eles afetam a sua funcionalidade corporal, o teu desempenho cognitivo. Olhares que precisam ser desmistificados nesse universo das mulheres que batalham contra o câncer de mama.
Até o momento já realizei 18 quimioterapias, sendo a última no final do mês de setembro. Estou em preparativos para a realização da radioterapia e posteriormente da imunoterapia."
Exames preventivos
"Minha rotina de exames sempre foi anual e com certeza esse foi um dos pontos que me ajudou, pois embora o meu tumor tenha crescido de forma rápida, foi diagnosticado em um período onde ainda se tem uma chance de cura de 95%."
Maidi fez 18 quimioterapias, sendo a última no final do mês de setembro. Agora, está em preparativos para a realização da radioterapia e, posteriormente, da imunoterapia
Conselho para quem enfrenta a batalha contra o câncer
"Encare a doença como os demais desafios que você já enfrentou na sua vida. Saiba que o mundo não se revoltou contra você e que ter câncer, seja de mama ou de qualquer tipo, não é uma punição, ou um presente para repensar a vida como muitas vezes você irá ouvir.
É um desafio que estará na sua vida. Estar vivo é correr riscos e estar suscetível a diversas doenças – e o câncer é apenas mais uma delas.
Não se assuste e procure viver uma etapa de cada vez. Não tenha medo de pedir ajuda aqueles que te amam e se permita ser ajudada. Irá ouvir de muitas pessoas que és forte e guerreira e que já está curada, mas apenas você irá saber a batalha que é dar conta disso a cada dia.
Seja forte, pois é com você mesma que irá contar todos os dias, pois apesar de termos família e muitos amigos a luta é pessoal e de longo prazo. Eu demorei a ter esse entendimento: é uma doença e não um momento temporário de uma infecção ou uma gripe. Aceitar isso nos deixa mais tranquilos quanto ao tempo que será necessário para todo o processo. Se conecte com outras pessoas que já passaram ou estão passando por isso e não tenha medo de mostrar a sua fragilidade e também a sua coragem."
A importância da família, dos amigos e da fé
"Quero destacar a importância da energia recebida de amigos e familiares. Minha família foi o pilar para que eu conseguisse passar por esse processo, pois não é apenas a ajuda nas diversas etapas que envolvem as inúmeras idas à clínicas e hospitais, ou nas atividades domésticas, mas sim o amor, a preocupação e a paciência em cada momento em que não conseguimos ser nós mesmas, que nos sentimos perdidas e sem esperança, pois isso acontece em muitos momentos...
Quanto aos amigos, sem palavras: receber o apoio de pessoas de todo o mundo, algumas com encorajamento, outras sem conseguir falar e chorando mais que eu, e alguns que passaram em oração por mim durante esse período é algo especial e que apenas a relação cultivada durante anos com as pessoas pode nos dar de presente num momento como este.
Outro ponto que precisamos nesses momentos é acreditar e ter fé. Acreditar é se sentir fazendo o seu melhor e não desistir jamais. Costumo dizer que não basta apenas a oração é preciso que nossa crença no processo faça a sua parte também.
Por fim, para mim ajudou a aceitar a doença e usar algo que trago comigo há muitos anos: o que de pior pode acontecer? No momento que fui diagnosticada pensei muito sobre isso e aceitei que o pior seria a morte! A partir desse olhar me dei conta que tinha cumprido o meu propósito junto a milhares de estudantes e professores e que meus filhos já tinham a contribuição que eu podia deixar para os seus futuros. Assim minha mente e meu corpo se acalmaram e pensei se é para ser, minha história vai falar por mim e, se o universo me conceder mais ‘vida’ aí sim tenho um compromisso de dar sequência na minha jornada e depois de estar curada continuar a entrega da minha melhor versão ao universo."
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