Lei que coloca gestantes em regime de teletrabalho gera dúvidas no empregador

Texto deixa lacunas de como o empregador deve proceder em alguns casos. Para gestantes, lei ajuda por um lado, mas pode desestimular a contratação de mulheres

Lei que coloca gestantes em regime de teletrabalho gera dúvidas no empregador
Gabriele Kroth, está em teletrabalho, à espera da Antônia, que tem nascimento previsto para outubro

Grávida de 6 meses, a servidora pública Gabriele Kroth, 32 anos, vê a lei do teletrabalho como um avanço importante para as empregadas grávidas. “A preservação da vida de mãe e filho deve vir acima de tudo, ainda mais com essa doença que mal conhecemos e que vem causando imensa catástrofe à vida das pessoas”. 


No entanto, a  servidora do departamento de pessoal da Prefeitura de Três de Maio, diz que sua experiência profissional faz com que se coloque também no lugar do empregador. “Sabemos que nem toda atividade é possível ser feita fora do ambiente de trabalho, e nesse caso, a obrigação de pagar o empregado segue sendo do órgão empregador, este que além de todas as despesas, terá que repor a mão de obra. Como mulher e futura mãe, acredito que deve existir sim a proteção à maternidade, mas deveria haver outras formas do Governo Federal auxiliar o empregador, pois essa lei pode desestimular ainda mais a contratação de mulheres”, opina a futura mamãe, que está à espera da Antônia. 

 

Como fica  a situação daquelas funções que não podem ser feitas através do teletrabalho?

A lei 14.151, que garante regime de teletrabalho às trabalhadoras gestantes durante a pandemia de Covid-19, foi sancionada no dia 13 de maio. O texto estabelece ainda que a substituição do trabalho presencial pelo remoto, para a trabalhadora gestante, deverá ocorrer sem redução de salário.


Com isso, muitas dúvidas surgiram, uma vez que existem trabalhos que não há como ser realizado através do teletrabalho, como o caso das empregadas domésticas. O Jornal Semanal conversou com a contadora Ligiane Zimermann, do Escritório ABC, para sanar alguns pontos que não estão claros na lei.


Conforme Ligiane,  o afastamento das gestantes é obrigatório e a lei determina que as elas sejam deslocadas para o teletrabalho, sem prejuízo de ganhos, durante a pandemia da Covid-19. Ou seja, elas não devem trabalhar de forma presencial.


Segundo a contadora, um questionamento que muitos patrões têm feito é com relação à possibilidade, ou não, de fazer suspensão do contrato de trabalho. “Há uma controvérsia no meio jurídico pois a empregada afastada tem que receber toda a remuneração, segundo a lei. Se há a suspensão do contrato, ela não receberá o valor total de acordo com a Medida provisória (MP) 1.045. Entendemos que, se ela for afastada e o empregador complementar a remuneração, é possível adotar a medida, porém não há previsão legal para esta opção”, explica a contadora.  


Segundo Ligiane, com relação às empregadas domésticas gestantes, como a lei não faz distinção de qualquer espécie de trabalhadora, elas também devem ser afastadas do trabalho presencial. Com relação à remuneração, “a lei não especifica quem é responsável pelo pagamento do salário nos casos de impossibilidade de função remota, como ocorre com as domésticas e frentistas. O que não é razoável é o empregador arcar sozinho com esse custo”, justifica a contadora. 

 

Para a contadora Ligiane Zimermann, lei deixou lacunas que geram muitas dúvidas para o empregador e até no meio jurídico

 

O que pode ser feito


A contadora sugere que antes de recorrer à suspensão dos contratos, os patrões busquem outras opções, como deslocar a funcionária para uma função temporária que permita o serviço remoto, ou mesmo adiantar férias e banco de horas.


O empregador tem como alternativa utilizar a suspensão temporária do contrato de trabalho, que foi estabelecida pela Medida Provisória 1.045. Neste caso, a empregada doméstica gestante receberia o benefício do INSS durante 120 dias. Além de utilizar a suspensão de quatro meses do contrato de trabalho, o empregador ainda pode antecipar até dois meses de férias, antecipar feriados ou usar banco de horas, até atingir o período de licença-maternidade da empregada, que pode ser requerido 28 dias antes do nascimento do bebê. “Mas lembrando que esta opção não estaria de acordo com o que estabelece a lei do afastamento, se houver redução no salário”, esclarece Ligiane.

 

Afastamento do trabalho pode causar impacto emocional nas gestantes 


Gabriele Kroth conta que, apesar do privilégio de conseguir realizar cerca de 90% do seu trabalho de casa e poder preservar a saúde dela e da bebê, toda a situação relacionada à pandemia, gera um desgaste emocional, principalmente pela fase delicada e sensível que é a gestação. 


“Trabalho há nove anos na Prefeitura, e nunca havia pego um dia de atestado na minha vida funcional. De repente, estou praticamente isolada da sociedade, a falta de contato diário com as pessoas do meu local de trabalho, mexe um pouco com meu psicológico. Mas hoje só posso ser grata pela minha vida, minha saúde e desse serzinho que estou gerando. Seguimos com muito trabalho e torcendo para tudo voltar ao ‘normal’”, finaliza.