"A mulher do campo também é uma empreendedora"

Desde cedo, Luciani envolve os filhos na atividade rural

Luciani Rafaela de Lima, 34 anos, nasceu no meio rural, em Rincão Mazzari, interior de Alegria. No entanto, quando ainda muito jovem, em 2005, mudou-se para Três de Maio em busca de oportunidades de trabalho. Logo começou a trabalhar e atuou em diversas empresas, mas foi na atividade leiteira que Luciani encontrou sua vocação. 

A descoberta ocorreu devido ao relacionamento com o jovem produtor rural Joel Rossi, de 38 anos. Após um tempo de namoro, em 2013, Luciani foi morar na propriedade rural da família Rossi, localizada em Medianeira, interior de Três de Maio. “Vim conhecer os prazeres de viver no interior. Foi bem desafiador, por mais que eu tenha vindo do interior, na casa do meu pai não aprendi nada sobre trabalhar no campo. Quando cheguei aqui, não sabia nada de atividade leiteira, nem de plantação”, relata.

Aos poucos, Joel foi ensinando à esposa todo o funcionamento de uma propriedade rural. “Aqui, aprendi com muito amor e dedicação a desenvolver as atividades no campo. Sou uma grande admiradora do meu marido; ele faz tudo com carinho e dedicação. Esse trabalho no campo emociona. É tão lindo ver a plantação se desenvolver, ver o bezerro nascer, alimentar os animais. Existe muito trabalho e estudo, afinal, não é porque você mora no interior que não precisa buscar conhecimento. Precisamos sempre estar nos atualizando”, acrescenta.

O casal tem dois filhos, Rafael Misael, de 11 anos, e Maria Helena, de 7. Na propriedade, a atividade principal é a bovinocultura de leite, com 25 vacas em ordenha e produção de aproximadamente 700 litros por dia. “Meus sogros sempre buscam passar para nós o que aprenderam, e é isso que também tentamos passar para os nossos filhos. Desde o comportamento até o trabalho e a alimentação. Então, tentamos dar boas lembranças aos nossos filhos”, diz. Ela complementa, ressaltando que “hoje me sinto feliz em poder contribuir para os meus filhos”.

 

O casal, Luciani e Cristiano, trabalham juntos na propriedade localizada em Medianeira

 

Temos um olhar diferenciado, mais detalhado

Luciani conta que, no começo, havia um olhar de dúvida quanto ao fato de ela trabalhar em uma leitaria. “Eu percebia que havia um certo preconceito por ser mulher, magrinha e ter vindo da cidade. As pessoas comentavam: ‘Mas você tira leite?’ ou ‘Mas você trabalha?’, como se não tivesse capacidade para isso”, descreve.

Para a agricultora, por mais que o trabalho no campo exija força física, a mulher é capaz. “Nós somos capazes, e a cada ano que passa buscamos melhorar. A mulher do campo também é uma empreendedora e deveria ter esse reconhecimento”, avalia.

Ela observa que as mulheres têm um olhar diferenciado na propriedade. “Eu acredito que a presença da mulher, além de fundamental, é extremamente valiosa. As mulheres desempenham um papel muito importante, desde a gerência da propriedade até as tomadas de decisões e também no trabalho físico. Onde a mulher precisa estar, nós estamos. Posso dizer por mim. Nós temos um olhar diferenciado, mais detalhado. Estamos dentro do nosso lar, cuidando dos nossos filhos, e precisamos estar pensando no amanhã, no lanche, no uniforme das crianças para a escola; ou seja, somos multitarefas”, ressalta.

 

Cursos fomentam o empreendedorismo no campo

Através de diversos programas e projetos, Luciani buscou conhecimento para aplicar na propriedade. “Com o Senar, já participei de cursos sobre temas como laticínios, tortas, embutidos, enfim, sobre vários assuntos. Também participamos do projeto Pisa, que foi fundamental para a nossa atividade. Foi um aprendizado durante quatro anos, posso dizer que foi uma faculdade para nós, o que nos deu um grande diferencial para a nossa propriedade”, disse.

Luciani vê essas oportunidades como valiosas para as agricultoras e as propriedades locais. “Hoje, nós temos mais acesso a esses cursos, e eles contribuem muito para o sucesso da propriedade. Ficamos menos dependentes de outros profissionais e sempre precisamos estar nos atualizando. Antigamente, se dizia que era perda de tempo, mas hoje em dia há muita tecnologia que vai se atualizando, e é muito positivo que isso tenha chegado cada vez mais aos agricultores”, declara.

Ela recorda que há muitas mulheres que têm utilizado essas oportunidades para empreender dentro de suas atividades. “Eu tenho amigas que fizeram cursos de queijos e iogurtes e que hoje conseguem ter renda através desse conhecimento adquirido. Elas estão agregando valor aos seus produtos. São mulheres se tornando cada vez mais independentes e ganhando seu dinheiro”, frisa.

 

Mulheres precisam ter mais voz na comunidade

Na opinião de Luciani, é necessário haver mais incentivo ao empreendedorismo das mulheres no meio rural. “Eu acho fundamental que as mulheres tenham mais acesso a crédito e financiamentos para que consigamos desenvolver as nossas próprias iniciativas no meio rural. É muito importante que as mulheres sejam incentivadas a participar desses programas de captação e treinamento dentro da nossa área. Precisamos ser reconhecidas e valorizadas. As mulheres produzem, são sustentáveis, e eu acho necessário que isso ocorra”, pontua.

Luciani finaliza, reforçando a ideia de que haja cada vez mais oportunidades para as mulheres do campo atuarem junto à comunidade. “É importante que as mulheres sejam incluídas em processos de tomada de decisões, para que tenham voz e influência política. Tudo isso impacta as comunidades. A mulher do meio rural, por vezes, fica quieta e não dá tanto a sua opinião. Mas eu acredito que, até mesmo dentro da política, seria importante que tivessem mulheres que representassem o meio rural e que levantassem nossas bandeiras. Temos mulheres com muita capacidade para isso, e muitas vezes estão escondidas”, conclui.