TRÊS DE MAIO E SUA HISTÓRIA - JUCA TIGRE E O DIA EM QUE NEVOU EM TRÊS DE MAIO

JUCA TIGRE E O DIA EM QUE NEVOU EM TRÊS DE MAIO
Atilio Casali nasceu em 1899 e, após ingressar no serviço militar, foi um dos primeiros a servir no regimento de cavalaria de Santa Maria. Era uma pessoa bastante calada, apesar de saber falar italiano e latim. Não se sabe por quais caminhos seguiu até acabar sendo destacado como soldado da Brigada Militar em Três de Maio, mas o que se sabe é que Atilio era um homem de honestidade a toda a prova, o que o tornou uma pessoa de grande confiança de todos.
Quem viajava ou saía de sua residência por algum motivo deixava-o como caseiro ou o utilizava para conduzir valores. Ia para Santa Rosa, fazia compras, levava dinheiro, trazia dinheiro, depositava em banco, levava crianças para casa e era bem quisto por todos.
Mas um dia sofreu uma decepção amorosa e não conseguiu mais se recuperar daquele baque. Ficou desorientado pelas ruas, em situação de mendicância, e por isso acabou sendo afastado da Brigada Militar.
Mesmo após sua demissão, dizem que guardou nos seus baús o fardamento de brigadiano, com o qual, de vez em quando, se vestia e marchava ou treinava como fazia nos velhos tempos.
Com o passar dos dias, seu cabelo e barba foram crescendo e suas roupas foram ficando sujas e desgrenhadas, passando ele a perambular pelas ruas bastante mal ajambrado. Logo foi perdendo, também, sua identidade e todos passaram a conhecê-lo mais pela alcunha de “Juca Tigre”.
Nas missas, era uma presença certa, sempre sentando-se no mesmo lugar, mais afastado dos demais. Era muito amigo do Dr. Portinho, médico que por muitos anos ficou à frente do Hospital São Vicente de Paulo e, inclusive, era a ele que o médico confiava recados e bilhetes importantes que porventura necessitasse que fossem entregues a alguém.
Costumava dormir sobre um papelão atrás do imóvel onde funcionava a Tecidos Buricá Ltda (hoje Sorveteria Cremolatto).
Em 1965, o inverno havia sido precedido por um período de muitas chuvas, que fizeram alguns rios transbordarem na região. Até que na fria manhã do dia 20 de agosto, os primeiros a acordar foram surpreendidos por algo inesperado quando uma fina camada branca de neve passou a cobrir todo o chão como um tapete aveludado, ao mesmo tempo em que uma incessante chuva de flocos caia do céu acinzentado. A neve era pegajosa, molhada e pesada. Muitos nunca haviam visto aquilo antes, e a falta de informação fazia correr boatos de que o mundo estava prestes a acabar.
Outros começaram a ter sensações estranhas, temendo que o frio pudesse congelar o sangue em suas veias e matá-los.
Mas outros, menos ingênuos quanto a este tipo de fenômeno, afirmavam que aquilo acontecia sempre a cada 70 anos por aqui.
Naquele dia, as aulas foram suspensas, e as crianças aproveitaram para brincar, fazendo guerrinhas com bolas de neve, construindo bonecos e pequenos castelos, e balançando árvores para fazer o que havia acumulado nas folhas cair sobre elas.
Logo uma camada de cerca de 20 centímetros começou a se acumular no chão e nos telhados.
O pastor da Comunidade Evangélica-Luterana São Paulo, Artur Wiedmann, estava em Flor de Maio nesse dia, onde foi celebrar a ceia do enfermo com uma mulher leta de 99 anos, e pôde ver homens tentando desesperadamente tirar a neve acumulada de cima do telhado dos galpões para que estes não acabassem desabando com o peso. Pelo mato em volta, ouvia-se a todo o momento o som de galhos de árvores se quebrando e descendo ao chão com muita violência.
No regresso à cidade, o pastor viu pela estrada à sua frente três jovens com poucas roupas e descalças, as quais, ao escutarem o ruído do motor da Kombi VW do pastor, voltaram-se e olharam para ele com olhar de quem espera ajuda, mas sem ter coragem de pedi-la.
O pastor parou o veículo ao lado delas e ofereceu carona. Estavam todas tremendo de frio, e ao entrarem na Kombi, sendo questionadas pelo pastor sobre o motivo de não estarem abrigadas do tempo, responderam: “Nossa mãe está internada no hospital do Dr. João e queremos vê-la antes do mundo terminar!”.
O jovem Joel Bueno, filho do laboratorista do Hospital Santo Antônio, saiu pelas ruas junto com amigos curiosos para ver o que a neve havia feito no centro da cidade e nas vilas situadas nos entornos.
Na esquina da Rua Sergipe (atual Rua Expedicionário Bertoldo Boeck) com a Rua Santo Ângelo, próximo ao Clube Buricá, depararam-se com Juca Tigre, que os vendo, sorriu e disse: “Tá chovendo açúcar”. Aquilo soou bastante singelo para os meninos devido a simplicidade de espírito do homem que conseguiu naquele momento tocar o lado mais puro e sereno de suas almas. Juca Tigre faleceu no dia 28 de outubro de 1977, aos 78 anos de idade, na Fundação Pão dos Pobres de Porto Alegre, depois de ter sido levado para lá por familiares, alguns anos antes.
Depois daquele dia nunca mais se teve notícias de neve em Três de Maio, apesar de alguns jurarem ter visto alguns flocos solitários caírem durante uma ou outra madrugada mais fria, e se isso realmente aconteceu, provavelmente que Juca Tigre os presenciou deitado sobre seu papelão, talvez, ainda comparando aquilo a uma chuva de flocos de açúcar.
Tentemos também enxergar as coisas assim em 2025.
Prefeito Ceslau Sawitzki ( de guarda-chuva) e funcionários da
prefeitura em meio a neve durante sua primeira administração
Leomar Tesche, aos 9 anos , ao lado de sua mãe, Romilda, no dia da
neve em frente à sua casa, localizada na Rua Sergipe, 289
Vários registros foram feitos no dia da neve: À direita na foto, o casal Timbaro e Mercedes (segurando a criança no colo), proprietários do antigo cinema Cine Imperial
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