TRÊS DE MAIO E SUA HISTÓRIA - CAÚNA

CAÚNA
As primeiras famílias a se estabelecerem na região começaram a chegar por volta de 1917, construindo casebres isolados às margens do Lajeado Lambedor.
O riacho recebeu este nome na época em que uma grande estiagem assolou a região, fazendo suas águas pararem de correr, o que acabou formando poças em concavidades sobre as lajes de pedra. Muitos animais vinham saciar a sede ali, principalmente as antas que habitavam o lugar, sendo frequentemente vistas lambendo as lajes em volta dessas poças. Por esse motivo, essas concavidades passaram a ser chamadas de “lambedores”, e como haviam muitas delas espalhadas ao longo do riacho, o canal acabou sendo chamado de “Lajeado Lambedor”, nome que passou a identificar também aquela área.
As primeiras famílias que chegaram ao local, provavelmente, foram aquelas que não conseguiram se estabelecer na região próxima a Flor de Maio por questões religiosas. Naquela área, estavam estabelecidos colonos e comerciantes ligados à IELB (Igreja Evangélica Luterana do Brasil), que seguia a doutrina fundamentada no Sínodo de Missouri, a qual mantinha, à época, fortes divergências com a então chamada “Igreja Evangélica Alemã” - anos mais tarde denominada “IECLB” (Igreja Evangélica de Confissão Luterana do Brasil), ligada ao Sínodo Rio-Grandense. Por conta disso, esses colonos decidiram seguir além, espalhando-se por toda uma extensa região que passou a ser chamada de “Caúna”. O nome vem das árvores do gênero Ilex, termo muito utilizado para denominar a erva-mate de qualidade inferior ou mais amarga, possivelmente porque essa espécie era comum na região.
Um dos primeiros colonos a chegar à área foi Frederico Sipp, natural de General Neto e filho de imigrantes alemães. Em 1919, ele veio para a região do Santa Rosa – Buricá com a intenção de comprar terras. Abrindo picadas no meio da mata, chegou em Lambedor Caúna, onde comprou uma área de terras, construiu um galpão e preparou uma pequena lavoura, onde plantou o primeiro pé de milho da região. Depois, voltou para General Neto buscar sua esposa, Augusta, e seu filho, Wilibaldo. Outros familiares o acompanharam em seu regresso a Caúna.
Com a chegada de mais famílias, em 20 de agosto de 1920, esses colonos construíram uma escola de madeira logo adiante de Lajeado Lambedor (Lat. -27.715744 Long. -54.205743 DD). A escola também passou a funcionar como igreja, e junto a ela foi instalado um cemitério, em um lote doado por Ernst Tesche.
Construir primeiro uma escola que também servisse como igreja era uma característica comum entre os colonos protestantes alemães da época, ao contrário de outras correntes religiosas, que priorizavam a construção de uma igreja antes da escola.
Sete famílias foram as primeiras a se estabelecer no lugar. Além dos familiares de Frederico Sipp, também fixou ali a família de Edgar Pommerehn, nascido em 27 de janeiro de 1887, natural de Santa Cruz do Sul e casado com Eugênia Georgina Paulina Gressler. Edgar instalou um bolicho no local e, anos depois, sua filha Erna casou-se no dia 8 de janeiro de 1938, com Albino Guilherme Sipp, filho de João e Karolina Sipp, casal que, além de Albino, teve mais onze filhos.
A família de Albino Sipp veio para Caúna em 1926, seguindo o mesmo caminho que seu tio, Frederico Sipp, e no local, em frente ao bolicho de Edgar Pommerehn, Albino construiu um salão de festas, que passou a ser chamado de “Salão Sipp”, e nele passaram a acontecer diversas festas e bailes, sendo o mais prestigiado deles, o “Baile do Rei”.
No Salão Sipp estava sediada a “Sociedade de Tiro ao Alvo de Caúna” da qual participavam cerca de cento e sessenta cavalheiros, e em dias de competição, aquele que acertasse mais vezes um alvo previamente estabelecido era coroado rei durante o Baile do Rei. Já entre as mulheres, era coroada rainha da “Sociedade de Damas de Caúna” aquela que fizesse mais pontos no jogo de bolãozinho. Isto tudo tornou o Salão Sipp uma referência no lugar e, por isso, o povoado passou a ser chamado de “Esquina Sipp”.
Ainda em 1938, quando Albino Sipp e Erna Pommerehn se casaram, a comunidade se uniu em um enorme mutirão para a construção de uma nova igreja, construída atrás da primeira escolinha, com tijolos maciços e forro de madeira, sendo inaugurada no ano seguinte.
Quase dez anos depois, no dia 14 de março de 1948, foram inaugurados os sinos que, assim como a nova igreja, foram adquiridos através de arrecadações com as copas de muitas festas e doações.
Após a Esquina Sipp se tornar a sede de Caúna, a extensa região foi dividida nominalmente em duas: “Caúna Alta” e “Caúna Baixa”. A primeira situa-se na área mais elevada, onde está localizada a Esquina Sipp, enquanto a segunda, na região mais baixa, estendendo-se até as margens do Rio Buricá.
Quando Edgar Pommerehn encerrou com as atividades de seu bolicho, em 1955, o jovem Benno Meurer, que trabalhava há anos trazendo mercadorias de caminhão de Ijuí para a casa comercial de Bruno Wünsch, situada a poucos quilômetros da Esquina Sipp, decidiu abrir uma casa de comércio naquela localidade, em sociedade com seu cunhado, Artêmio Gauger. O pequeno estabelecimento de madeira possuía um porão, onde havia um galinheiro de onde eram retiradas as galinhas que eram vendidas. Ali também eram comercializados tecidos, tabaco, fumo, feijão e diversos produtos para os colonos da região.
Benno Germano Meurer, nascido em 05 de abril de 1924, natural de Monte Alverne (hoje distrito de Santa Cruz do Sul), aos 21 anos de idade veio para Três de Maio para trabalhar na firma de Bruno Wünsch, na chamada Esquina Wünsch, onde inicialmente exerceu a função de empregado do armazém. Após, passou a ser motorista da firma, transportando porcos para Ijuí e trazendo mercadorias para o comércio da família Wünsch.
Em 4 de dezembro de 1948, casou-se com Ella Gauger (nasc. 29.09.1927), filha de Germano Gauger e Anna Sipp, e tempos depois, mesmo ainda não tendo filhos, assumiu a função de tesoureiro da Sociedade Escolar de Caúna por diversas gestões. Quando faltava dinheiro para pagamento do salário dos professores, Benno Meurer os pagava com recursos de seu próprio estabelecimento, para que eles não ficassem desamparados.
Com o tempo, Benno Meurer trouxe para trabalhar consigo o jovem Erno Hatje (nasc. 24.06.1937), filho de Arnaldo Hatje e Hilda Eggers, que naquele momento havia dado baixa no Exército. Aos poucos, Erno assumiu a administração do negócio, até se tornar sócio.
Em 1960, após o prematuro falecimento de Benno Meurer, aos 36 anos de idade, Erno Hatje, em sociedade com a esposa de Meurer, começou a construir um imóvel mais amplo para a casa comercial. O prédio em alvenaria foi inaugurado em 1963 e permaneceu funcionando sob a administração de Erno Hatje por mais de 40 anos.
No decorrer das décadas seguintes, Erno Hatje se tornou uma influente liderança na comunidade de Caúna. Na década de 1990, se organizou com os demais moradores e, depois de muitos rabiscos no papel, idealizaram a construção de um enorme ginásio na Vila. O projeto foi financiado com campanhas, bailes de Kerb, e doações de muitas sacas de soja pelos colonos da região, tendo esta conquista virado, inclusive, matéria do Jornal Zero Hora com o título “Mutirão ergue ginásio de esportes em lugarejo” a qual começava afirmando: “As onze casas do pequeno vilarejo de Caúna, no interior de Três de Maio, caberiam com folga dentro do novo ginásio da localidade” e destacava “... a obra, financiada com o resultado das lavouras de soja produzidas pelos próprios moradores, contrasta com a simplicidade do lugar”.
De fato, a obra de 1.392 m² inaugurada no dia 11 de maio de 1997 se agiganta em um lugar pitoresco, e sua inauguração marcou o fim do antigo Salão Sipp, que nos anos que se seguiram foi demolido e teve suas tábuas vendidas para um agricultor de uma cidade vizinha que as utilizou na construção de chiqueiros.
Antes disso, nos anos de 1960, a escolinha da localidade, que em anos anteriores havia sido reconstruída, ganhando mais espaço, passou para a jurisdição do Estado, quando então recebeu o nome de “Escola Rural Isolada de Kaúna” e, em 1978, a Comunidade Evangélica de Caúna, por meio de seu presidente, Erno Hatje, cedeu ao Estado duas áreas construídas em terras doadas por Carlos Sipp para a comunidade, existentes atrás da igreja, para que nelas passasse a funcionar a escola, a qual o Estado ampliou adquirindo mais dois hectares do próprio Carlos Sipp, e teve seu nome mudado para “Escola Rural Benno Meurer”, como uma forma de homenagear o homem que, literalmente, se doou para ajudar a mantê-la nos tempos de dificuldade.
Em 2016, devido ao baixo número de alunos, a escola foi fechada pelo Governo Estadual. Dois anos depois, o Município a reabriu o educandário, e colocou o nome de “Escola Bem Viver de Caúna”. Cerca de 70% de seus alunos passaram a se deslocar diariamente da cidade até a escola diariamente.
Em 2023, como que reafirmando seu pendor para a educação àqueles homens e mulheres que há mais de cem anos escolheram o lugar para construírem uma escola, a Escola Bem Viver de Caúna se destacou alcançando o melhor Índice de Desenvolvimento da Educação Básica do município (IDEB).
Hoje, os ventos que sopram no lugar ainda trazem um pouco da poeira que outrora seus pioneiros pisaram, e as nuvens que se veem no horizonte prenunciam que novos tempos ainda hão de chegar.
Revisão: Dr. Prof. Leomar Tesche
Os primeiros moradores do local, em frente à escola construída pela comunidade em 192O
Integrantes da Sociedade de Tiro ao Alvo de Caúna em registro fotográfico feito
em frente o Salão Sipp, antes de um Baile do Rei
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