Cultivo de linhaça: uma nova alternativa produtiva para agricultores
Pouco difundida na região - área semeada varia de ano para ano, mas oscila entre 10 mil e 15 mil hectares -, a cultura também proporciona melhorias nas condições de solo, quando incluída na rotação de culturas de inverno
Tradição que passa de pai para filho, Jetro Pilau, 72 anos, e Alessandro Pilau, 49, são produtores rurais que atuam com a diversificação de culturas. Jetro se encontra há mais de 50 anos na agricultura. O filho trabalha há 20 ao lado do pai.
Os dois contam que a opção pelo cultivo de linhaça marrom surgiu há cerca de 10 anos e que o cereal entra num esquema de rotação de culturas onde aveia preta, nabo forrageiro e pastagem de inverno com aveia antecedem a cultura do trigo a ser semeada no ano subsequente.
Segundo Alessandro, a área pode variar de 80 a 150 hectares por ano. As áreas produtoras se encontram no município de Giruá e Itaqui. “Eventualmente, pode ser incluído o plantio de canola e girassol no inverno, o que acaba fracionando ainda nas a área destinada a linhaça”, explica.
Nicho de mercado
Na opinião de Alessandro, por representar um nicho de mercado, o linho nunca teve no Brasil um processo de evolução genética, o que leva a cultura a ter uma produtividade muito baixa e pouco responsiva ao manejo com adubação, ficando na faixa de 800 a 1.400 quilos por hectare.
Contudo, o produtor rural avalia que se o cereal for incluído dentro de um sistema de rotação de culturas no inverno se torna rentável. “Apesar de que, no nosso caso, a linhaça é beneficiada e passada na mesa de gravidade, onde, uma parte vira semente própria e o restante da produção é vendida geralmente para o Sudeste do país com um valor agregado maior do que os compradores locais”, finaliza.
Existe demanda para a comercialização da cultura, diz o engenheiro agrônomo Marcos Caraffa
O fomento ao cultivo de linho é uma estratégia de qualificação dos sistemas de produção agrícola na região, tendo, inclusive, destaque no Programa de Melhoramento Genético de Linho e Painço, do curso de Agronomia da Faculdade Setrem.
A Instituição, através do curso de Agronomia, coordenado pelo engenheiro agrônomo, professor e mestre, Marcos Caraffa, vem desenvolvendo pesquisas de melhoramento genético em linho desde 2015. E agora, trabalha com cultivares de linho melhoradas para o uso nos sistemas produtivos dos agricultores dos estados do Rio Grande do Sul e Santa Catarina, visando maior rentabilidade, melhorias nas condições de solos e fonte de renda para as famílias.
A seguir, confira uma entrevista com engenheiro agrônomo, Marcos Caraffa, que fala sobre a cultura
JORNAL SEMANAL: Qual a diferença entre linho e linhaça?
MARCOS CARAFFA: linho é o nome usual, sendo a espécie que cultivamos denominada Linum usitatissimum, ou seja, pertence ao gênero Linum. Essa espécie está inclusa na família das lináceas, daí ser comumente conhecida como linhaça.
JS: Qual a finalidade da cultura?
Existe o linho têxtil (utilizado em tecelagem desde épocas mais remotas do que as de início de utilização da lã, face as longas fibras que contém) e o linho oleaginoso, tanto o marrom como o conhecido por linhaça dourada (utilizado para alimentação humana – um ótimo alimento funcional, ou seja, que melhora as condições do organismo humano, assim como para fábrica de tintas, vernizes, esmaltes, massas para fixação de vidros, oleados, cera pra aplicação em enxertos, etc.., podendo sua torta, com alto teor proteico, ser utilizada no arraçoamento de bovinos e suínos).
JS: Eles são linhos de espécies diferentes?
Não, eles pertencem à mesma espécie, o que os diferencia é a seleção genética para uma ou outra finalidade, produção de óleo ou longas fibras.
JS: O linho é muito cultivado mundialmente? Qual a extensão de área cultivada com a cultura no mundo?
Desde a década de 1980 o linho ocupa área superior a 5 milhões de hectares cultivados, sendo que as maiores áreas de cultivo se encontram na Ásia (1,8 milhão de hectares) e conjunto de países da antiga União Soviética (1,1 milhão de hectares). Já, a maior produção é gerada nos EUA (aproximadamente 1.150.000 toneladas). Destacam-se na produção também o Canadá, pelo volume produzido, e a Nova Zelândia (pelo rendimento de grãos), esse, inclusive, é o local onde o linho é muito consumido na alimentação humana, cabendo se frisar que esse é um dos países com melhor Índice de Desenvolvimento Humano do mundo.
JS: O Rio Grande do Sul produz linho historicamente, no entanto, houve época em que praticamente não se ouviu falar de cultivo da cultura. Poderias nos explicar o/s motivo/s para tal fato?
Realmente, essa é uma interessante constatação. O RS chegou a cultivar 50 mil hectares na década de 1950, atingindo o menor patamar de cultivo em 1980, quando foram semeados apenas 350 hectares com linho. Após, estabilizou. Aqui na região, embora a área semeada varie de ano para ano, estima-se que a mesma oscila entre 10 mil e 15 mil hectares.
As causas dessa parca área de cultivo foram os preços baixos (decorrentes da diminuição do preço do petróleo, pois seus derivados concorrem com a cultura quando para usos que não alimentação humana), ocorrência de doenças (com difícil controle por parte dos produtores) e, sobretudo, a concorrência do cultivo da soja, já que os linhos tradicionais têm ciclo muito longo, adentrando à melhor época de semeadura da soja. Soma-se a esses fatos a cultura ter fama de ser “esgotante de solo”, o que é uma falácia.
JS: Se a cultura, impede a semeadura da soja na melhor época, há possibilidade de ainda ser mantida nos sistemas de produção da região, já que aqui a soja é a principal fonte de renda da maioria das propriedades rurais que operam com produção de grãos?
Sim, tem futuro. Como? Graças ao melhoramento genético, como o que vem sendo efetuado pela Faculdade de Agronomia da Setrem, buscando, sobretudo, variedades de ciclo mais curto, mais produtivas e adaptadas a cultivo mais precoce (permitindo adequado encaixe entre o linho e a soja), além de plantas com porte mais baixo (gerando, portanto, menor acamamento).
JS: Quanto rende uma lavoura de linho e quanto é o custo de produção?
Os linhos tradicionais costumam gerar rendimento de grãos entre 15 e 20 sacas por hectare. Hoje, materiais genéticos do Programa de Pesquisa da Faculdade de Agronomia da Setrem, tem atingido, em ensaios experimentais, o patamar de 30 sacas por hectare. O custo variável de produção atual da cultura gira em torno de R$ 1.250,00 por hectare, equivalendo a aproximadamente 7 a 7,5 sacas de grãos (de 60 kg), uma vez que o valor de comercialização do produto está em torno de R$ 174,00 a saca. Considerando um rendimento de grãos de 20 sacas por hectare e custo de produção de 7,5 sacas, a receita líquida, descontados apenas os custos variáveis de produção, fica em torno de R$ 2.175,00 por hectare.
Receita muito interessante, considerando ser gerada no período de inverno, quando a maior parte das áreas do Estado ficam em pousio. Além de gerar renda permite diluir os custos fixos das unidades de produção agropecuárias, uma vez que, para sua produção, se utiliza maquinaria, equipamentos e mão de obra já existentes nessas unidades.
JS: Existe demanda para a comercialização da cultura?
Sim, com certeza. Inclusive, historicamente, o Brasil importa linho, sobretudo da Argentina e, segundo relatos recentes que tivemos de gestores de grandes empresas comercializadoras da cultura, não há limitação de área cultivada, nesse momento, capaz de comprometer a liquidez do produto.
JS - Onde o produtor pode buscar assistência técnica?
As informações técnicas sobre a cultura podem ser obtidas junto à Faculdade de Agronomia da Setrem, a qual, além de prestar informações pode efetuar encaminhamento para assistência técnica qualificada.
JS: Onde o produtor pode vender sua produção de linho aqui na região?
Existem várias opções de comercialização, mas as principais empresas compradoras de linho aqui na região são a Cerealsul (de Independência), a Celena (de Giruá) e a Dubai (de Ijuí).
Grande parte da produção é utilizada para as lojas da franquia Mais Natural
O produtor rural Leonel Luiz Martini cultiva linhaça em lavouras localizadas nos municípios de Independência e Catuípe, onde intercala a plantação. Em média, são destinados entre 50 e 100 hectares, a cada ano, para o cultivo de linhaça dourada
Tendo a agricultura como legado de família, o produtor rural Leonel Luiz Martini cultiva linhaça em lavouras nos municípios de Independência e Catuípe, onde intercala a plantação.
Em média, por ano, ele destina entre 50 e 100 hectares para o cultivo de linhaça dourada (há mais dez anos deixou de plantar a linhaça marrom). A produtividade média fica entre 15 e 25 sacas por hectare.
Segundo o produtor rural, a atividade é rentável, mas cíclica, pois depende do volume de colheita e do preço da venda do produto.
Até o ano de 2008, 100% da venda era destinada a terceiros.
A partir de 2012, parte da produção começou a ser destinada para as lojas Mais Natural espalhadas por 11 estados do Brasil e, a outra parte, ainda é comercializada com terceiros.
A família foi uma das primeiras da região a destinar áreas para a cultura do linho.
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